Arteterapia é aliada no processo de tratamento e cura do câncer

Pacientes descobrem na arte uma forma de expressar os sentimentos represados, do diagnóstico do câncer à alta médica, e relatam melhora na condição psicológica
Campinas/SP: Era começo da pandemia da COVID-19 quando Síntia Cristina Cunha descobriu o câncer de mama. Síntia tinha câncer nas duas mamas e dois tipos diferentes de tumor, sendo um deles extremamente agressivo. Ela conta que nunca vai se esquecer do dia em que chegou em casa com todos os exames que havia feito e caiu no choro diante de toda aquela papelada que indicava uma longa jornada. “Eu me sentei no chão e chorei muito, muito mesmo, até cansar. Depois, recobrei meu senso prático e voltei para o racional, porque o meu instinto de sobrevivência me chamava”, relembra Síntia. O quadro de ansiedade se intensificou durante esse período e as crises de pânico se tornaram frequentes na vida dela. Foi somente na décima sessão de quimioterapia que ela diz ter começado a entender os sintomas da ansiedade e processar o que estava acontecendo com ela desde o diagnóstico do câncer. “Minha terapeuta sugeriu uma atividade diferente, ligada à expressão artística. Comecei com desenhos e na sequência fui para a aquarela. Foi quando eu consegui elaborar a minha situação”, explica Síntia.
A arteterapia é uma prática terapêutica, que utiliza diferentes formas de expressão artística — como pintura, desenho, modelagem, colagem, escrita, música — para cuidar da saúde emocional. O foco não está no resultado estético, mas no processo criativo, que permite que sentimentos difíceis encontrem caminhos de expressão e elaboração. A arteterapia nasce no espaço entre a dor e o alívio, entre o que machuca e o que cura, explica o oncologista Leonardo Silva, do Grupo SOnHe. “Mais do que uma atividade, a arteterapia é uma forma de cuidar com delicadeza, oferecendo ao paciente um jeito de se expressar sem pressa, sem julgamento, apenas sendo. A arte, nesse contexto, é presença, é cuidado, é escuta”, pontua o oncologista.
O emprego da arte como forma de tratamento de doenças não é algo novo. O oncologista do Grupo SOnHe explica que a arteterapia tem suas raízes com o artista e escritor britânico Adrian Hill, que definiu a arte como “a inimiga das doenças”. Na década de 1940, ele começou a realizar estudos com a aplicação de arteterapia, evidenciando efeitos benéficos na redução do estresse e melhora do estado psicológico dos pacientes. Atualmente, programas de medicina complementar e integrativa já são considerados componentes-chave no suporte ao paciente oncológico, inclusive com recomendações da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO) e pela Sociedade de Oncologia Integrativa (SIO), especialmente para pacientes com diagnóstico de câncer de mama. “A arteterapia se insere entre as terapias recomendadas, com objetivo de auxiliar no controle de sintomas como ansiedade e estresse, bem como outros efeitos colaterais do tratamento”, explica o oncologista.
A arte também trouxe vida nova à dentista Cynthia Almeida, dias depois de fazer a cirurgia nas mamas. Incomodada com a exigência do repouso, Cynthia se dedicou ao bordado e, por meio dele, ressignificou o câncer. “O bordado me ajudou na recuperação da cirurgia, mesmo que de forma supervisionada”, relembra a dentista, que não podia se esforçar muito para não ter inchaços nos membros. Cynthia decidiu que bordaria um quadro, inspirado no poema “Pegadas na Areia”, enquanto passasse pelas sessões de quimioterapia. A meta era concluir o trabalho o tratamento ao mesmo tempo. “Era o meu momento de não pensar em nada e de me esquecer de tudo que eu era impossibilitada de fazer em função do câncer. Ver o quadro ganhando forma representava o fim do meu tratamento e fazia com que eu me sentisse ativa, viva novamente”, conta Cynthia.
Um estudo com mulheres, diagnosticadas com câncer de mama e que se inseriram em diferentes tipos de arteterapia visual, observou quatro efeitos positivos: a arteterapia permitiu às mulheres mudar o foco do pensamento para aspectos mais positivos na vida, diminuindo a preocupação com o câncer; reforço da autovalorização e da identidade pessoal; a arteterapia foi associada a um efeito positivo na manutenção de uma identidade social, permitindo às mulheres resistirem a serem definidas pelo câncer; a arteterapia permitiu a expressão de seus sentimentos de forma simbólica, especialmente durante o tratamento. Recentemente, médicos da cidade suíça de Neuchâtel lançaram um programa piloto com duração prevista de 2 anos, no qual as autoridades locais proverão visitas a museus prescritas pelos médicos aos pacientes. Com base em um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) publicado em 2019, o objetivo do projeto é promover a melhora da saúde mental, reduzir os impactos negativos de traumas, reduzir o risco de declínio cognitivo e da fragilidade física, bem como reduzir a mortalidade prematura. Caso seja bem-sucedido, o plano é de ampliação do projeto para inclusão de espetáculos de teatro e dança. “A arte se apresenta como uma linguagem capaz de traduzir o que muitas vezes não se consegue dizer em palavras, promovendo alívio emocional, fortalecimento da autoestima e resgate do sentido de si”, alerta Leonardo Silva. Para o oncologista, incluir a arteterapia no cuidado de pessoas com câncer é reconhecer que saúde vai além do corpo. “Quando olhamos para o ser humano de forma integral, a arte se revela não apenas como expressão, mas como presença, como companhia e como forma de cuidado. E isso faz toda a diferença, conclui o oncologista.
"A queda das danadas I" - Por Síntia Cunha
Trata-se de uma instalação na qual corpos de bonecas vestidas de nadadoras realizam, aparentemente, um salto ornamental coletivo. Entretanto, essas nadadoras em queda, na verdade, despencam do céu, como os "danados em queda" nas recorrentes pinturas sobre o assunto. Do mesmo modo que "os danados", as nadadoras, numa perspectiva religiosa ocidental, foram derrubadas de algum lugar no qual a perfeição dos corpos vigorava. Fadadas às novas circunstâncias, adentram um espaço aéreo no qual os seus corpos são reelaborados de forma biologicamente incoerente, impossível.
“A queda das danadas II” - Por Síntia Cunha
O segundo trabalho está dividido em duas partes, a primeira parte são impressões em gel de fotografias de partes do meu corpo, unidas por suturas em fio cirúrgico. A segunda parte tambem são impressões em gel de fotografias de partes do meu corpo, mas sem a sutura. Essas partes aparecem justapostas ou sobrepostas.
Busco nesse trabalho outras formas de conceber possíveis geometrias e arquiteturas corporais. Sobreposições, junções, repetições de partes do meu corpo desafiam concepções clássicas sobre ele e convidam o expectador a se emancipar, diversificando iconografias que tem o corpo como tema recorrente.
"Pegadas na Areia" - por Cynthia Almeida
“Eu estava sendo carregada naquele momento, fui amparada e meus pés não estavam no chão”.
Sobre o Grupo SOnHe
O Grupo SOnHe - Oncologia e Hematologia é formado por oncologistas e hematologistas que fazem atendimento oncológico alinhado às recentes descobertas da ciência, com tratamento integral, humanizado e multidisciplinar em importantes centros de tratamento de câncer em Campinas, como o Hospital Santa Tereza, Oncologia Vera Cruz e Hospital Puc-Campinas. O Grupo oferece excelência no cuidado oncológico e na produção de conhecimento de forma ética, científica e humanitária, por meio de uma equipe inovadora e sempre comprometida com o ser humano. O SOnHe é formado por 18 especialistas sendo três deles com doutorado e três com mestrado. Fazem parte do grupo os oncologistas André Deeke Sasse, David Pinheiro Cunha, Vinícius Correa da Conceição, Vivian Castro Antunes de Vasconcelos, Rafael Luís, Susana Ramalho, Leonardo Roberto da Silva, Higor Mantovani, Débora Curi, Isabela Pinheiro, Amanda Negrini, Laís Feres, Nayara Nardini, Giselle Rocha, Nathalia Monnerat e pelas hematologistas Lorena Bedotti, Jamille Cunha e Isabella Constantini. Saiba mais: no portal www.sonhe.med.br e nas redes sociais.
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